quinta-feira, 17 de maio de 2012

1968 - O ANO QUE NUNCA ACABOU!!!!

Eric Hobsbawm


A história não costuma adequar-se à conveniência das pessoas que gostam de separá-la em períodos estanques, mas há momentos em que parece apiedar-se delas. O ano de 1968 é uma data importante na história de todos os três mundos nos quais os observadores gostavam de dividir o planeta na era da Guerra Fria: o "Primeiro Mundo" do capitalismo ocidental, o "Segundo Mundo" dos países comunistas e o "Terceiro Mundo" da Ásia, África e América Latina. Quase se tem a impressão de que 68 pode ter sido planejado para servir como uma espécie de ponto de referência histórico.
Nenhum daqueles de nós que vivemos o ano de 1968 vai esquecê-lo, nunca. Para todos nós ele contém acontecimentos públicos que nos comoveram do mesmo modo que os americanos — mas não apenas eles — recordam ter sido comovidos pelo assassinato do presidente Kennedy. Nós o recordamos não apenas como manchetes de jornais ou imagens na TV, mas como parte integral de nossas vidas pessoais. Agora, enquanto escrevo, consigo ver a grande enxurrada de estudantes cujas manifestações lotavam as ruas de Paris no início de maio, à qual se juntava, de terno e gravata formais, meu amigo Albert Souboul respeitável historiador da Revolução Francesa, profundamente desaprovador da contracultura e da esquerda heterodoxa, mas moralmente compelido a sair em passeata "quand le peuple descend dans la rue" (quando o povo vai para as ruas). Eu me vejo caminhando por um árido vale galês numa manhã de agosto, incrédulo e desesperado depois de ouvir no jornal matutino da rádio a notícia da invasão soviética da Tcheco-Eslováquia. Basta dizer — "1968" e nós, que já éramos maiores de idade na época, mergulha-mos de volta naquele ano extraordinário.
Por outro lado, aqueles para quem 1968 é uma memória viva hoje estão na meia-idade ou já são velhos. Quem estava vivo em 1968 necessariamente tem pelo menos 3O anos hoje. Quase ninguém com menos de 45 anos pode legitimamente considerar esse grande ano parte de sua vida consciente. Assim, para o benefício das gerações posteriores a 1968, pode ser útil começar por recordar o que realmente aconteceu durante aqueles 12 meses notáveis.
Quase tudo foi inesperado. As economias dos países ocidentais viviam auge do que os observadores franceses iriam chamar de "les trente glorieuses", a maior era de prosperidade e crescimento na história do mundo industrializada A última coisa que previam seus políticos, ou mesmo seus intelectuais reconhecidos, eram tumultos em cidades como Paris ou a conversão aparentemente repentina de uma massa de homens e mulheres jovens de classe média à causa revolucionária. A última coisa que qualquer pessoa esperava na época, dentro ou fora do mundo comunista era o que aconteceu na Tcheco-Eslováquia: um partido comunista no governo se convertendo oficialmente a um pluralismo tolerante.
Já era possível prever que os EUA, com todo seu poderio global, não poderiam manter sue posição permanentemente no Vietnã, mas quem, mesmo no Natal de 1967, previa a ofensiva do Tet e seu impacto quase imediato sobre a política interna dos EUA?
Esse caráter aparentemente repentino e inesperado foi o que tornou os acontecimentos de 1968 tão dramáticos e espantosos. E houve muitos desses acontecimentos... O ano começou, ou com a ofensiva norte-vietnamita do Tet, que, como hoje sabemos, rompeu a determinação dos EUA e tornou certa sua derrota no Vietnã. Levou quase imediatamente a decisão do presidente Lyndon Johnson de não candidatar-se a reeleição, em grande medida devido a pressão das manifestações

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